Estados Unidos da América (EUA). País que se orgulha de ser, há muito, um dos pioneiros na luta pela igualdade, liberdade e justiça dos povos. Acostumado a tomar as dores de outros países injustiçados por seus algozes, os EUA passam a ideia ao mundo de ser um modelo de ética a ser seguido por outras nações. Todavia, os acontecimentos históricos dos últimos anos mostram que esse país foi tão antiético, injusto e amoral quanto os seus rivais.
Os que conhece história não conseguem entender o motivo do arrasador bombardeio de Dresden durante a segunda guerra mundial que culminou com a morte de mais de quinhentos mil civis alemães. É, no mínimo, antiético tentar justificar a morte de milhares de inocentes japoneses de Hiroshima e Nagasaki com o uso da bomba atômica para "forçar" o Japão a se render e, assim, pôs fim à segunda guerra. Assassinato secreto de cidadãos americanos ditos "traidores da pátria" vai contra a própria constituição americana. Espionagem de países por parte dos EUA já não é novidade, mas incomoda bastante, além de desenhar ao mundo um perfil americano nada agradável. Isso tudo é odiável, mas experimentos com doentes mentais e prisioneiros é demais! Lembra um certo Mengele.
Em setembro de 2010, a Comissão Presidencial para o Estudo de Temas de Bioetica divulgou o relatório Ethically Impossible, sobre experimentos com seres humanos levados a cabo por médicos ligados ao serviço público de saúde dos EUA na Guatemala de 1946 a 1948, para testes relacionados a sífilis e blenorragia. Liderada pelo renomado médico John
C. Cutler, a equipe de médicos americanos, apenas oito meses depois do julgamento e execução dos culpados pelas atrocidades nazistas em Nuremberg após a segunda guerra mundial, foi forçada a encerrar seus trabalhos pelo governo americano que abafou o caso, vindo a público apenas sessenta anos depois. Ao longo destes sessenta anos, Cutler recebeu prêmios, fama e dinheiro, enquanto que Josef Mengele e seus comparsas eram caçados na América do Sul pelos judeus. Por que a comparação? Simples! Ambos, Mengele e Cutler, eram iguais em suas ações. Diferiam, apenas, no país de origem. Um foi odiado e o outro amado. Até que, convenientemente após passar uma geração de culpados, vem a público como o médico americano trabalhava.
Cutler, especialista em DST, fazia experimentos em presos e doentes mentais no país da Guatemala. O governo deixava, desde que os pacientes não fossem americanos.
Bactérias eram inoculadas nos órgãos sexuais de homens e mulheres doentes mentais e no sangue de prisioneiros. Prostitutas eram infectadas intencionalmente antes de terem relações sexuais com os prisioneiros que, achando que estavam sendo agraciados pelo "bondoso" governo americano, adquiriam imediatamente doenças venérias para serem estudados ao longo de dias. Ao todo, cerca de setecentas pessoas foram infectadas propositalmente para estudo com bactérias da sífilis e da gonorréia na busca de uma dose ideal de tratamento com penicilina. O que aconteceu a todas essas pessoas ninguém sabe, mas algumas foram destaques na comissão americana presidencial para o Estudo de Temas de Bioetica que tornou público os experimentos odiosos do "nazista americano" John Cutler. Berta era uma delas:
"Berta era paciente no Hospital Psiquiátrico. Sua idade e a doença que a levou ao hospital são desconhecidos. Em fevereiro de 1948, Berta foi injectada com sífilis em seu braço esquerdo. Um mês depois, desenvolveu sarna. Várias semanas depois, o dr. Cutler notou que ela também desenvolveu bolas vermelhas no local da injeção, lesões em seus braços e pernas, e que sua pele estava começando a se descolar de seu corpo. Berta não foi tratada da sífilis até três meses depois da infecção. Logo depois, em 23 de agosto, o dr. Cutler registrou que Berta parecia estar perto de morrer, mas não especificou o porquê. Nesse mesmo dia, ele colocou pus de gonorreia colhido de um outro paciente nos olhos de Berta, e também em sua uretra e reto. Além disso, reinfectou-a com sífilis. Alguns dias depois, os olhos de Berta estavam cheios de pus da gonorreia, e ela estava sangrando pela uretra. No dia 27 de agosto, ela morreu".
Todos Sabiam
A Comissão de ética presidencial oficial (que pode ser vista na íntegra AQUI) aponta também uma grave falha institucional - nenhum funcionário em nenhum nível hierárquico impediu a continuidade das atividades na Guatemala. O relatório evidencia que, do chefe do Conselho de Pesquisa da Presidência dos Estados Unidos, Vannevar Bush, a J.F. Mahoney, todos tomaram conhecimento, com maior ou menor detalhe, do que acontecia no país da América Central. Ninguém mandou parar antes de dois anos de atrocidade organizada.
O "NAZISTA AMERICANO"
John C. Cutler viveu até 2003, como um festejado especialista nas hoje "DSTs". Participou, na ordem, dos experimentos de 1943-1944 na penitenciária Terre Haute, no Estado de Indiana, em que falharam os esforços do Laboratório de Pesquisa em Doenças Venéreas para criar
uma metodologia efetiva para a inoculação intencional de sujeitos com DSTs; capitaneou o projeto da Guatemala, de 1946 a 1947; em 1953, participou do experimento na Prisão Sing Sing, em que 62 prisioneiros foram submetidos a inoculação cutânea e subcutânea de contaminados com sífilis; em 1960, se juntou ao Experimento de Tuskegee, já mencionado. Em 1988, escreveu "Venereal Disease Control by Health Departaments in the Past: Lessons for the Present", artigo bastante conhecido publicado no American Journal of Public Health, edição de 23 de maio.
Obama pede desculpas... tarde, "muito" tarde demais
Em 1º de outubro de 2010, o presidente Obama telefonou ao presidente guatemalteco Álvaro Colom, para apresentar desculpas oficiais dos EUA ao povo do país. Seguiu-se ao telefonema de Obama uma declaração conjunta, assinada pela Secretária da Saude, Kathleen Sibelius, e pela Secretária de Estado, Hillary Clinton. O pedido de desculpas, na declaração delas, se dirige especialmente aos sobreviventes e descendentes da pesquisa.
Mário Lobato
Mário Lobato
FONTES: Scielo e livro "A História do Século XX pelas Descobertas da Medicina", dos autores Stefan C. Ujvari e Tarso Adoni.
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