Este seria o motivo de adoçantes não despertarem o
mesmo apetite que o açúcar comum, por mais que seu sabor procure se aproximar
do sabor do outro. O que conta não é o gosto, mas a quantidade de calorias. A
tese é defendida pelo grupo do neurocientista Ivan de Araújo, que investiga
como alimentos calóricos estimulam os centros de recompensa do cérebro.
Professor dos
departamentos de Psiquiatria e de Fisiologia da Universidade de Yale, nos EUA,
Araújo procura explicações para a epidemia global de obesidade. Suas pesquisas
estão entre os destaques do IX Congresso Mundial da Organização Internacional
de Pesquisa do Cérebro (Ibro 2015), que levará ao Centro de Convenções
SulAmérica, na Cidade Nova, de terça a sábado da semana que vem, os maiores especialistas
do mundo em neurociência.
— Mesmo sem perceber, buscamos calorias — afirma o
pesquisador, que chefia o programa de Neurobiologia da Alimentação do
Laboratório John B. Pierce, também de Yale.
Acumular calorias para o cérebro significa ter
energia suficiente para coisas básicas, como a fertilidade e a reprodução.
Calorias são energia e o corpo humano possui um sistema complexo, resultado da
seleção natural. Seu papel é acumular a energia dos alimentos. A falta de
comida acompanhou a Humanidade por milhares de anos. A abundância de alimentos
é recente, insignificante em termos evolutivos.
— O resultado é que temos corpos não adaptados à
vida contemporânea, em que a comida é abundante e extremamente calórica. Há
todo um sistema biológico preparado para captar calorias. Ele surgiu porque na
natureza a comida é escassa. Nosso estilo de vida mudou, mas o sistema continua
lá — salienta Araújo.
O cientista e seu seu
grupo descobriram que o açúcar ativa uma região do duodeno (parte do intestino
delgado) que envia sinais específicos ao cérebro. O duodeno comunica aos
centros de recompensa do cérebro — que nos proporcionam sentir prazer e
saciedade — que um alimento é calórico. Os pesquisadores também descobriram que
o cérebro tem um grupo específico de neurônios sensíveis ao açúcar. Ingerir
açúcar deflagra a liberação de dopamina, que dá a sensação de prazer e faz com
que desejemos ainda mais doces. É por isso que eles provocam satisfação. Quanto
mais comemos, menos sensível o sistema se torna e mais açúcar é necessário para
liberar dopamina.
O cérebro de uma pessoa que engorda funciona como o
de dependentes em uma droga qualquer, que precisa cada vez mais desta para
obter o mesmo prazer. Um ciclo vicioso que, para Araújo, só pode ser quebrado
com reeducação alimentar. E, nos casos extremos, de obesidade severa, cirurgias
bariátricas que reduzam o duodeno.
— Assim, menos calorias seriam captadas, e a pessoa
mudaria o comportamento e passaria a querer menos alimentos engordativos —
explica o cientista.
Ele começou o estudo com camundongos transgênicos
modificados para não perceberem o sabor doce. Os camundongos que não sentem o
gosto do doce, porém, são tão loucos por açúcar quanto os roedores comuns. E
não se deixam enganar por adoçantes, ignoram o produto como o fazem com
alimentos menos calóricos e dão preferência aos que têm açúcar.
— Adoçantes não tiveram o sucesso esperado porque
não enganam o cérebro e não saciam nossa vontade de comer doces. Para nós, isso
acontece porque não são calóricos — frisa Araújo.
HOMEM ENGORDOU
O GATO
O grupo de Araújo observou que, se é dado um
alimento de baixa caloria a um animal obeso, ele o ignora. Já o roedor magro
come. O obeso só vai comer o não calórico quando passar muito tempo sem comida
e não tiver opção. Outra descoberta foi a de que carboidratos e açúcares em
forma líquida ou cremosa são muito mais engordativos e viciantes.
— O líquido é absorvido quase que imediatamente.
Provoca uma resposta cerebral mais potente. Refrigerantes, sorvetes,
milk-shakes e até mesmo o insuspeito açaí levam a um consumo maior de calorias
— afirma.
E adorar açúcar não é
uma particularidade humana. O açúcar é precioso e raro na natureza. Como é
energético, todos os animais, da mosca ao cachorro, apresentam compulsão por
acumulá-lo. Há apenas uma exceção: os felinos.
— Os felinos não detectam o doce da mesma forma.
São estritamente carnívoros, muito especializados em proteínas e têm
dificuldade de metabolizar glicose — conta Araújo.
Entretanto, mesmo entre os felinos, a companhia
humana teve impacto. O gato engordou com o homem. Os gatos domésticos são os
únicos a apresentar uma mutação que os torna adoradores de gordura, isto é,
lipídios. Garfield e seus iguais adoram mesmo lasanha. E isso, como para os
humanos, só lhes causa problemas. O gato doméstico ama gordura e, se esta for
farta, ele não só engorda, como se torna diabético e hipoglicêmico. Tal dono,
tal gato.
FONTE: O GLOBO
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