Não é só de impressão: a
cafeína realmente ajuda a melhorar o ânimo e a memória, e pode até combater
sinais de depressão. É o que mostra uma pesquisa realizada pela Universidade de
Coimbra, em Portugal, e apresentada nesta sexta-feira no 9º Congresso Mundial
de Neurociência da Organização Internacional de Pesquisa do Cérebro (IBRO, na
sigla em inglês), no Rio de Janeiro. No estudo, pesquisadores identificaram em
camundongos que a substância é capaz de inibir os receptores que provocam
diversos sintomas da depressão, uma das doenças com maiores custos
socioeconômicos do mundo ocidental.
Publicado no mês passado
no periódico científico "Proceedings of the National Academy of
Sciences", nos EUA, o estudo liderado pelo neurocientista português
Rodrigo Cunha contou ainda com a participação de quatro pesquisadoras
brasileiras: Manuella Kaster e Ana Lúcia Rodrigues, da Universidade Federal de
Santa Catarina (UFSC); além de Ana Paula Ardais e Lisiane O. Porciúncula, da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
No estudo, dois grupos de ratinhos foram submetidos
a sucessivas situações negativas e extremas de estresse, como privação de água
e exposição a baixas temperaturas, durante três semanas — mas só um dos grupos
recebeu doses diárias de cafeína.
Ao final do período, os cientistas observaram que
enquanto o grupo que não consumiu a substância passou a apresentar alterações
de comportamento como imobilidade, ansiedade, perda de prazer e sociabilidade e
deterioração de memória — todos sintomas típicos de depressão —, os animais que
receberam café foram menos impactados por esses efeitos.
— A partir daí, nosso passo seguinte foi tentar
identificar como a cafeína atuava ao nível molecular para inibir os efeitos da
depressão. Suspeitávamos que os receptores A2A para adenosina, que funcionam
como uma espécie de sinal de estresse para o organismo, tivessem um papel
importante para a doença, e foi isso que conseguimos confirmar — afirma Rodrigo
Cunha.
Depois de observar que os ratos com sinais de
depressão passaram a apresentar uma maior atividade dos A2A para a adenosina,
os pesquisadores passaram a aplicar nestes animais a istradefilina, uma fármaco
da família da cafeína que inibe a atuação desses receptores. O resultado? Os
camundongos passaram a apresentar melhorias significativas em apenas três
semanas, voltando o seu comportamento a níveis semelhantes ao grupo de animais
saudáveis.
— Trabalhos anteriores já mostravam que a cafeína
possui um papel na recuperação da memória e na capacidade de locomoção para
pacientes de doenças como Parkinson e Alzheimer, mas nosso trabalho foi o
primeiro a mostrar como essa substância também pode ser muito importante
combater modificações de humor nos animais — explica Cunha.
NOVOS
TRATAMENTOS CONTRA A DEPRESSÃO
A expectativa do pesquisador agora é realizar um
estudo semelhante em humanos:
— Nossa grande esperança
é confirmar esse efeito em humanos e aí criarmos novos remédios para a
depressão. Só na Europa esta doença tem um custo socioeconômico estimado em
cerca de € 300 bilhões por ano. No momento, estamos em fase de captação de
recursos para o novo estudo, que deve ser mais demorado e caro do que este
primeiro, já que será realizado com pessoas.
DUAS A TRÊS
XÍCARAS DE EXPRESSO
Para aqueles que desejam aderir ao cafezinho para
melhorar a memória, ou simplesmente se animar mais, o neurocientista faz
algumas recomendações:
— Em geral, de 2 a 3 xícaras de expresso, de 12 ml
com cerca de 75mg cafeína cada uma, por dia são capazes de provocar alguns
benefícios. No entanto, isso varia de pessoa para pessoa, já que a
sensibilidade à substância é particular a cada um. Agora, o consumo de cafeína
não é recomendado para pessoas com problemas de gastrite e mulheres grávidas.